Appareil lhote, porcelana, século XIX |
No tradicional Almanaque Laemmert, edição publicada no Rio de Janeiro em 1888, um anúncio gabava as pretensas propriedades medicinais da chamada água de Selters:
"Laemmert & C. são os únicos importadores em diretura do estabelecimento thermal do governo real da Prússia, em Nieders-Selters, de quem tem constantemente em depósito água fresca de Selters, natural e pura como sahe da nascente.
A água de Selters é recommendada pelos primeiros médicos nas moléstias do fígado, dos rins, hemorrhoidaes e hystericas, secreções ourinárias, afecções gástricas e biliosas, escrófulas e flores brancas, tísica, asthma, febre héctica, etc., etc."[1]
O mesmo anúncio alertava os consumidores que não se deixassem enganar, pois somente a água de Selters natural, gaseificada na fonte, seria realmente eficaz:
"A respeito da diferença que existe entre os efeitos da água natural e artificial se lê na obra do célebre Dr. James “Guide pratique aux caux minérales” à pág. 245: Entre a água de Selters natural e artificial nada há de commum senão o nome, e apezar (sic) das pretensões desta última e sua voga, ella nunca passará de um agradável estimulante ao paladar, ao passo que sua rival opera como útil, digestiva, etc."[2]
Sifão, vidro e metal, século XX |
A água gaseificada natural foi extraída desde o século XVIII de fontes da região de Nieders-Selters, engarrafada e comercializada por toda a Europa, sempre associada a propriedades terapêuticas. O produto se popularizou com o nome de “Água de Selters” ou “Seltz”.
Mais tarde, descobriu-se um método de produzir artificialmente esse líquido, e passou-se a poder obtê-la no ambiente doméstico, bastando para isso que se possuísse o appareil lhote, recipiente que acondicionava em câmaras separadas duas substâncias específicas (bicarbonato de sódio e ácido tartárico) que, quando misturadas no momento do consumo, produziam por reação química a gaseificação. Esse método foi muito comum até o final do século XIX. Outra forma de consumo do produto era através do sifão, uma garrafa de vidro reforçado, envolvida em malha de ferro, contendo a bebida já gaseificada em alta pressão, que podia ser liberada pelo acionamento de uma válvula na extremidade superior da peça.
Aos poucos, o líquido foi perdendo o caráter medicinal, e passou a ser consumido em conjunto com bebidas alcoólicas, hábito difundido principalmente a partir da Inglaterra.
No acervo do MCHA encontram-se itens relacionados a essas duas formas de consumo da água carbonatada, como se pode ver nas fotos. Acredita-se que estejam relacionados ao uso medicinal, uma vez que, desde a última década do século XIX até meados do seguinte, uma botica funcionou no primeiro pavimento do sobrado que abriga a instituição.
[1] Almanaque Laemmert, edição 1888, pp. 499-500. Todas as edições deste Almanaque estão disponíveis no endereço eletrônico: http://www.crl.edu/brazil
[2] Idem, p. 500.
Fotos: Sylvana Lobo
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